Sempre digo que qualquer pretexto pra remar é bom.
Nosso amigo, novo amigo, Mauro, lá do CRG, estava com algumas dificuladades pra "vencer" o Cara de Cão:
"Tenho tentado ir da enseada de Botafogo até a Praia Vermelha. Entretanto, quando chego ao final do costão do Forte São João, na entrada da Baía, o caiaque fica muito instável. Como não tenho experiência e ando sozinho, prefiro não arriscar e volto. Alguém teria alguma dica de uma outra rota mais tranquila, ou uma sugestão de como remar melhor nestas condições."
Aí começou. O Marcão disse mais ou menos assim:
"Tem que treinar subir e descer do caiaque em alto mar, treinar, treinar e treinar..."
Depois foi a vez do Maurício:
"Não tem truque, meu caro. Tem treino. Vai capotar meeesmo antes de ganhar equilibrio. Então é fundamental saber retornar pra dentro do barco. E pra isso, treino...rs. E nenhuma maneira melhor de treinar do que encarar o mar. Vai capotar, vai passar perrengue, mas, quando der por si, vai estar remando em qualquer mar sem estresse. Esteja sempre de colete, esteja acompanhado, e vamos pro mar!!"
Então falei:
"Nas esquinas da Ponta de S. João, do Pão de Açúcar e do Leme é normal o mar estar mexido. São gargalos com fundo mais raso, perto da costeira, o mar fica meio anárquico.
Remar só , mesmo quando já se é cascudo é sempre mais arriscado, nada recomendável. O ideal é estar sempre acompanhado e não remar em mar mais arisco do que aquele em que já se treinou as manobras de resgate e recuperação, solo, em duplas, em trincas. Reconhecer os limites físicos e psi, isso é bom, muito bom. Não vale a pena correr riscos desnecessários. Palavra de quem já naufragou."
No que a Flávia completou:
"Para os machos, um aviso: virar de propósito é uma excelente maneira de treinar capotagem. Eu pegava o caiaque, ali na PV (mas pode ser feito na PU) e ficava a uns 50 metros da areia, caindo de propósito na água e voltando pra cima do caiaque, fazia 5 vezes direto. Cansa MUITO, mas me ajudou muito, pois quando acontecia de virar SEM querer, o corpo já estava acostumado... Errar de propósito é muito divertido... E outra: faça algo que não tenha nada a ver com caiaque...como dançar...por exemplo...saber sentir os quadris é essencial para sentir o remar...afinal é na bunda que sentamos quando no mar..."
A Flávia é uma atleta nata, da nata. Tem a sensibilidade e a disposição certas; um equilíbrio fundamental pra quem rema nesse marzão. Treinar é como ela disse: simular situações pra acostumar o corpo a ter as reações justas num momento de real necessidade.
No final das contas, a Letícia se propôs a acompanhar o novo amigo pelas esquinas das beiradas.
"Mauro, sexta às seis vou sair da PU em canoa individual, se quiser fazer o trajeto até a PV comigo vou te acompanhando e dando umas humildes dicas para cruzar o Cara de Cão."
Daí juntou uma porção de gente pra levar o mauro pra fora da baía de Guanabara. antes, porém, o Bruno falou um pouco sobre essa parte da orla carioca e deu algumas dicas mais:
"No final do costão do Forte São João é onde o mar fica mais agitado pois se forma uma espécie de gargalo onde toda a água que entra e sai da baía passa. Tomando o Forte da Lage como referência, há dois canais, o maior e mais seguro, a exceção dos navios, chamado de barra grande (F. Sta. Cruz-F. Lage) e o menor (Forte S. João-Lage) conhecido como barra pequena que é onde a criança chora e a mãe não vê. Ali, vários fatores se juntam para que seja uma zona turbulenta: a pouca profundidade do canal, as ondas, a forçada de maré e o vento indefinido. A influência da costeira faz dessa parte, em minha opinião, a zona de maior perigo que temos por aqui, lembrando que acima de 2,5m as ondas quebram e impressionam até o mais casca grossa dos surfistas.
Após todo esse blábláblá, vamos aos pontos chaves e dicas do percurso:
- Use sempre o material de segurança (COLETE,SAIA,CABO);
- Antes de se arriscar em mar aberto sem alguém experiente, é necessário que vc saiba, no mínimo, as técnicas de saída molhada, auto resgate e de resgate assistido;
- Se não se sentir seguro, atravesse pelo canal da barra grande, tomando cuidado com os navios (conheça o balizamento náutico);
- Preste atenção na maré, na lua cheia e nova, há maior variação de maré e sabendo do horário da cheia e vazia, é possivel fazer uma passagem segura, lembrando que a pior situação é a terceira e quarta hora da maré. Evite passar nesse momento pois é quando o mar está mais agitado, principalmente com a maré vazando.
- Conheça seus limites e saiba aonde está se metendo, abortar uma missão ou ficar em terra esperando o mar abaixar é a decisão mais difícil de tomar. Esteja pronto para tomar decisões.
- Parabéns pelo lindo caiaque e pela iniciativa de perguntar e buscar adquirir conhecimento sobre o local."
Resultou que hoje fizemos uma bela remada com 15 canoistas acompanhando o Mauro.
Como disse lá em cima: qualquer pretexto é bom pra remar.
Seguem algumas fotos: