Intermediários

Processos, ferramentas e ambientes para objetivos subjetivos

O que é invisível a nós? Que coisas escapam aos cinco sentidos, que estão presentes mas não podem ser definidas? Ou seria a pergunta, o que é o invisível?

Um objeto é comum. Porém quando é portador de um poder, o que passa a ser? Um talismã, uma arma, um instrumento? O poder transforma o objeto em um veículo, uma ferramenta que permite ao seu operador realizar o objetivo proposto. Igualmente, uma área quando designada e delimitada passa a ser o espaço que possibilita o acontecimento do objetivo proposto. E interessam também os espaços de fronteiras pouco definidas, como são os espaços emocionais e espirituais, da mesma forma os dos sonhos e os das fantasias. Espaços estes que são abstratos e impalpáveis, que se permeiam e se confundem entre si, onde entramos e de onde saímos constantemente sem nos dar conta.

Os objetos-espaços atuam entre o físico, o psicológico, o emocional e o invisível. São intermediários e como tal passam a depositários de possibilidades, poderes e anseios. Pontuam o silêncio. São ações poéticas que existem no vazio entre as continuidades.

Rodrigo Cardoso, 2006



quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Expedição Rumo Sul - Travessia em caiaque oceânico de Conceição de Jacareí a Santos: falando de golfinhos


Já faz um mês que Eu e Pedro voltamos da Expedição e ainda estamos processando...
Partimos dia 3 de janeiro de Jacareí com mais 22 canoistas pra fazer um mutirão de limpeza na Praia do Leste, Ilha Grande, promovido pelo CCC em parceria com a administração do Parque Estadual da Ilha Grande e Inea. Passamos pela Praia dos Castelhamos e pernoitamos no casarão do CEADS em Dois Rios. Depois fomos para Parnaioca, e no dia 5 retiramos 220 sacos de lixo da reserva biológica com a participação do pessoal do PEIG e de alguns turistas. Voltamos para Parnaioca e no dia seguinte partimos definitivamente rumo sul.
Até aí não avistamos golfinho algum, mas as pessoas diziam ter visto grupos alguns dias antes em Parnaioca e Martins de Sá, onde passamos a noite do dia 6 em um rancho emprestado pelo Seu Maneco. Seriam golfinhos? Seria verdade? É possível que sim. Estava ficando preocupado. Já remava há quatro dias e nada de golfinhos. Será que os veria? Enquanto isso me amarrava pra tirar fotos, com medo de não ter bateria ou memória na máquina se os golfinhos aparecessem.
Mas no quinto dia, dia 7/1, nos deparamos com um pequeno grupo de golfinhos na enseada da Praia de Caxadaço em Trindade. Na hora foi confuso porque já tinha uma ou duas voadeiras com turistas se aproximando dos bichos. Filmamos e tiramos fotos, mas as imagens não ficaram muito boas, pelo menos não o suficiente para que a Liliane possa identificar os indivíduos pelas características das barbatanas dorsais.
Ficamos mais animados, cheios de esperança e também cheios de dúvidas. E se não avistássemos mais nenhum grupo? Ver golfinhos é uma questão de estar no lugar certo na hora certa, de um acaso. Não seria mais fácil se os moradores das praias, por terem mais chances de fazer avistamentos, integrassem a rede de colaboradores do Projeto Golfinhos Fliper? Teriam que ser instruidos, teriam que ter acesso à internet ou poder remeter fichas de avistagens...
Em Trindade tem lan house e gente capaz de compor a rede. Fizemos contato com um pessoal do quiosque Trinta Réis e do Camping das Bromélias. Os dois negócios pertencem à Dona Marta, mas são os filhos Tanguinho e Onildo que estão mais a frente. O Onildo tem e-mail e telefone. Os irmãos e o pessoal da casa dizem que os golfinhos aparecem com frequência pela manhã e que depois somem por causa das voadeiras de turistas. Puxa! Esses barqueiros têm que ser informados para não jogar os botes em cima dos bichos, senão daqui a pouco não veremos mais nenhum por alí. Na verdade, se forem minimamente instruidos, poderão vir a ser excelentes colaboradores do projeto em vez de atrapalhar a vida dos golfinhos.
Isso me fez pensar com meus dedos dos pés descalços: não vou ficar esperando ver golfinhos. Vou tentar alinhavar uma trama com as pessoas que encontrar no caminho. Pescadores, Caiçaras, pousadeiros, barqueiros, qualquer pessoa local pode ajudar. E de repente surgiu a imagem do caiaque como uma agulha a tecer a rede de colaboradores do projeto. Gostei da imagem.
De Trindade fomos para Ubatuba. Passando ao largo da Ilha de Prumirim, vimos duas ou três Toninhas, botos rosa! Pequenininhos! Mas não consegimos registrar imagens. Uma pena!
Então nos dirigimos para a Ilha de Prumirim e desembarcamos para passar a noite. Foi uma noite terrível! O Seu Aquino nos emprestou um rancho de canoas cuja cobertura não estava em condição de suportar o temporal que desabou. Era chuva grossa e vento forte. Felizmente e graças aos nossos toldos plásticos conseguimos arrumar um jeito de dormir sem molhar nada.
Na manhã seguinte conversamos com o pessoal da Ilha. São todos de uma mesma família caiçara mas não residem de forma permanente na ilha, estão lá para atender turistas nos quiosques. Otoniel e Ismael são filhos de D. Isolina do "Quiosque da Ilha", são mais ligados à pesca, e afirmam ver grupos grandes de Toninhas, Flipers e até baleias nas enseadas de Prumirim, Ipuruba e Ubatumirim. Jâmile tem 13 anos, é filha da Luciana e neta da D. Isolina e quer ser bióloga marinha. Mexe com internet , mas a mãe não deixa ela ter um e-mail porque tem medo que ela se meta em alguma roubada virtual. Enfim, moram em Ubatuba e achei que essa menina poderia ajudar e ser ajudada de alguma forma. Será que vale uma tentativa de fazer da Jâmile uma colaboradora? Peguei o endereço da família.
Dia 9, sétimo dia. Passamos na Ilha das Couves para ver o Pipoca, um velho conhecido da travessia que fizemos em 2007, mas ele não estava. Seguimos para a Ilha Anchieta. Perto da Ponta Grossa o leme quebrou. Começava uma nova etapa onde nossas habilidades de canoistas seriam colocadas a prova. Não seria fácil "regular" a remada para conduzir o caiaque em linha reta, mas estávamos confiantes e cheios de disposição.
Aos poucos fomos nos acertando na remada. Como estava na popa, tive que me adaptar e me esforçar bastante nas varreduras e "caçadas" para manter o rumo. Ainda bem que o barco, um Atlantic da Opium, é muito bom até sem leme, que meu parceiro é um remador forte e experiente e que o conjunto se entrosou muito bem.
Chegamos à Ilha Anchieta depois de 3h30 e desembarcamos na praia das Palmas, onde fica o centro de visitantes do Parque Estadual da Ilha Anchieta e as ruinas da antiga Colônia Correcional do Porto de Palmas. Não fazia ideia da existência desse parque e fiquei encantado com a descoberta.
Fomos recebidos pela Luciana e pelo Yuri, estudantes de biologia e engenharia florestal respectivamente, estagiários da USP de Piracicaba. Conversamos sobre o parque e sobre golfinhos. Eles disseram ter visto um grupo bem grande dias antes, e é lógico que pensamos em como seria oportuno uma parceria entre o programa de estágio do parque e o Projeto Golfinhos Fliper. Não seria otimo envolver essas pessoas na rede de colaboradores? Peguei os e-mails para contato posterior. E a trama da nossa rede aumentava...
Ficamos mais de uma hora por alí vagando. Pegamos um folheto, visitamos o museu e as ruinas do presídio. Caiu uma chuva pesada e rápida, e, quando estiou, seguimos para a Praia do Sul, contornando a ilha no sentido anti-horário. Em menos de uma hora já estávamos bebendo uma cervejinha no Rancho do Joel.
Betum é o patrão, sócio do Joel em um cerco e no bar onde servem cerveja, refrigerante e peixe frito. Dois Beneditos, um de 60 e outro de 70 anos, fortes como garotos, trabalham com o Joel e Betum. Duas outras estagiárias do parque, Paula e Carolina, faziam uma pesquisa com turistas no local.
Betum nos convidou pra jantar e pernoitar no rancho, mas antes fomos até o cerco ver se tinha algum peixe na rede e como não havia nada voltamos para a praia e fomos dormir cedo.
A praia do Sul é bem isolada e foge um pouco às regras do parque. Apesar do fluxo de turistas, está bem preservada. Até vimos um quati bem gordo comendo jaca perto do rancho.
No dia seguinte partimos para Ilha de São Sebastião. Acertamos bem a marcação da bússola e do GPS porque a visibilidade estava muito restrita. Foi mais uma bela oportunidade de testar nossas habilidades de navegadores. Remamos uns 30 km e chegamos certinho na praia do Ribeirão do Poço. Zigezagueamos entre as pedras, entramos no ribeirão até a cachoeira e depois desembarcamos na pequena praia de areia grossa. Escondida entre a vegetação tinha uma casa cheia de estilo. Logo apareceu o Seu Pixinguinha, o caseiro, que nos autorizou montar nosso acampamento ao lado da cerca. Penamos com os borrachudos e com a chuva que caiu durante toda tarde e à noite.
De madrugada acordamos para preparar a partida. Fomos para a praia dos Castelhanos bem cedo e, quando chegamos, fomos direto ver um camping e almoçar. Mais um dia de remada sem ver golfinhos, mas sabíamos que teríamos boas chances de fazer contato com a comunidade local.
Conhecemos a Vivian, caiçara que mantem um bar no canto esquerdo da praia. Segundo ela, na enseada são avistados grandes grupos de golfinhos e até baleias. Ela se interessou pela ideia de fazer parte da rede de colaboradores pois está em contato direto com os pescadores da colônia. Sua irmã, inclusive, é presidente da associação. O problema é que ela não tem acesso á internet, mas mesmo assim anotei seu telefone e endereço. Ela ainda nos informou que na vila tem uma escola e uma associação de moradores, ou seja, existe uma boa possibilidade de envolver estudantes e a comunidade. Outra aspecto positivo é que no centro, em Ilha Bela, tem lan house.
Nossas canelas inchadas e temperadas com repelente a base de erva cidreira fizeram um banquete para os borrachudos durante a tarde. Nos recolhemos para evitar maiores danos. Meu pé já estava do tamanho de uma melancia, parecendo pé de cachaceiro.
Nossa próxima parada foi a Praia do Bonete. Fui logo procurar alguém que pudesse nos ajudar na costura da rede de colaboradores. Na Pousada Canto Bravo conheci o André, gerente da pousada, e o Anderson, canoísta da Turma do Remo. Eles já tem um projeto ligado à observação de aves e se interessaram pela rede. Anotei na minha tabuleta os e-mails e voltei pra perto do caiaque. A noite já cobria a praia quando deixei os dois.
Do Bonete fomos pra Galhetas, depois pra Barra do Una, Indaiá... Fizemos uma parada na praia do Berbigão onde conhecemos uma família de paulistas. Nos convidaram para beber uma cerveja. Foi um momento muito agradável que passamos com eles.

Demos seguimento à nossa jornada sem avistar nenhum golfinho e sem fazer nenhum contato para a rede de colaboradores. Só na Praia do Pernambuco, no Guarujá, voltamos a encontrar pessoas interessadas no projeto. Desembarcamos perto da Ilha do Mar Casado e passamos a tarde junto com o pessoal da Marina Aquilla Maris que opera um banana boat alí na praia. Bruna, Tamirys, Julio Maradona e Cyntia nos adotaram e graças a eles pudemos usufruir de um abrigo, primeiro do sol, depois da chuva. Todo dia chovia no final da tarde.
Peguei o e-mail da Tamirys para um futuro contato para tratar de possível parceria entre a marina e o projeto, mas, na verdade, foi a Cyntia, gerente da marina, quem mais se interessou por ser uma "apaixonada por golfinhos". Ela disse que as avistagens são comuns naquela praia, mas que seria preciso pensar numa maneira de instruir os usuários da marina para envolvê-los no projeto.
Em frente de onde a gente estava fica a Ilha do arvoredo, onde funciona um centro de reabilitação de animais marinhos. O desembarque precisa de uma autorização que não teríamos tempo de conseguir, mas peguei os e-mails para passar pra Liliane.
No final da tarde veio a chuva. Armamos nosso toldo e passamos uma noite bem tranquila apesar dos holofotes da praia.
Na manhã seguinte seguimos para Santos onde fomos recebidos pelos amigos da Canoa Brasil e pela Andressa, encerrando a primeira metade da nossa expedição.
Creio que, apesar de termos feito apenas uma avistagem de golfinhos e de não termos conseguido imagens de boa qualidade, os contatos feitos durante a travessia servirão para compor, no futuro, nossa rede de colabooradores. O próximo passo é correr atrás de patrocinadores para financiar palestras e material impresso para formar as pessoas interessadas em nos ajudar. Mas isso já é outra história. Por hora, e antes que eu me esqueça, as cordenadas do avistamento de golfinhos em Trindade são: 23° 21' 35.11'' S / 44° 43' 30.73'' W. As Toninhas foram vistas em 23° 23' 21.95'' S / 44° 56' 44.01'' W.
No mais quero deixar um grande abraço e agradecer mais uma vez aos amigos Fábio, Motta, Ronaldo, Kate, Arthur, André e Andressa pelo carinho e apoio que nos deram em Santos, lembrando, também, que nosso projeto só se concretizou porque tivemos ajuda  de muita gente boa como o Fernando do Lions Clube, Renata da Herbalife, Pepe da Gatorade, do Thiago do Bar Baixo Gago, Luiza do rádio Oceânica de Niteroi, Fernando da loja Adventura, Marcia da Graphimage, Jayme da Promarca, Claudia da papelaria Holiday, Luiz do site cagarras.com, Proveti da Gol, Higor da Staff Medic, Aline do Instituto Mar Adentro, Leo, Dominique, Letícia, Paulo Lana, Teté...

2 comentários:

  1. Muito bom! Melhor ainda é alinhavar uma alternativa para registro de avistamento de golfinhos. Em anos remando, poucas vezes avistei. Florianólis, praia da Solidão é onde mais vi, inclusive nesse carnaval eles faziam visitas diárias pela manhã. Grandes e escuros, pena não ter conseguido registrar para ajudar no teu alinhavar da colcha de registros. Bela matéria Comandante, bela viagem!!! Grande beijo Lê

    ResponderExcluir